Enquanto a Vale faz anúncios de lucros exorbitantes que enchem seus cofres, os municípios mineradores travam uma verdadeira batalha na tentativa de receber da empresa uma dívida que já perdura há mais de 20 anos. A empresa distribuiu, em 1º de setembro, R$ 16,2 bilhões em dividendos, conforme anúncio da própria Vale. Por outro lado, continua se negando a repassar os R$2,3 bilhões em royalties devidos às 28 cidades brasileiras.
No dia 24 de agosto, a AMIG e os municípios credores iniciaram uma campanha nacional para dar visibilidade pública ao impacto negativo causado aos cofres públicos pela dívida da Vale, em função do não recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), referente à pelotização do minério de ferro, uma das fases de beneficiamento do mineral.
De acordo com Waldir Salvador, consultor de Relações Institucionais e Desenvolvimento Econômico da AMIG, a dívida foi auditada pela Agência Nacional de Mineração (ANM), na época Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). “É uma dívida que foi apurada de 1996 a 2005, ou seja, daqui a três anos, ela vai completar 30 anos”, afirma Waldir Salvador. “Fomos à Vale inúmeras vezes para dialogar. A justiça derrotou por 13 vezes em primeira instância e uma vez em segunda instância a tese que a Vale defende para não pagar o royalty. E já perdeu todas as vezes administrativamente. Inclusive, a dívida foi ratificada em um grupo de trabalho em 2018, formado pelas prefeituras e pela ANM a pedido da própria Vale”, enfatiza.
O consultor destaca que depois de tantas tratativas com a empresa, a associação e os municípios não têm mais o que aguardar. “Queremos que se cumpra a lei. Ela deve pagar. A AMIG não faz essa cobrança pública feliz. Essas mazelas só dão subsídios para quem é inimigo da atividade mineradora. E a AMIG não é adversária da mineradora e muito menos da mineração, Só queremos que seja uma atividade íntegra, decente e sustentável para ambas as partes (mineradoras e municípios)”, pontua.
Os R$ 16 bilhões que foram repassados aos acionistas da Vale é o terceiro repasse de lucros da empresa em pouco mais de um ano. Waldir Salvador pontua ainda os desempenhos anteriores da empresa, que em 2021, lucrou R$ 120 bilhões. “Se a Vale tem resultados espetaculares, por que não pode cumprir a legislação?”, questiona Salvador.
Segundo o consultor da AMIG, há uma enorme contradição da Vale com a legislação brasileira. “Quando a mineradora precisa de um alvará para lavra ou pesquisa, ou quando necessita dar crédito à segurança de suas barragens, ela usa e abusa da boa influência e competência da Agência Nacional de Mineração”, alerta. Segundo Salvador, é comum ver anúncios da empresa que diz “minha barragem tem esse grau de segurança conforme atestado pela ANM, o grande órgão fiscalizador do setor. Mas na hora de pagar o royalty, ela inverte o jogo. Ela desacredita a agência e não concorda com a cobrança feita pelo órgão. Até quando teremos que ver essa relação que a mineradora tem com o setor de ‘dois pesos e duas medidas’? Até quando teremos que engolir essa postura por conveniência? Não dá para continuar assim”, enfatiza Salvador.
Minério-dependência
Os recursos captados pela CFEM poderiam ser utilizados pelos municípios para investir, por exemplo, na educação, saúde, políticas públicas e diversas outras ações para melhorar a qualidade de vida nos distritos mineradores.
Além disso, a falta de investimento nos municípios e a sonegação das empresas acentuam a minério-dependência nas cidades. “Quanto menos você aplica em educação, menos mão de obra você tem para oferecer para novos negócios, infraestrutura e a cidade fica menos competitiva para atrair novos investimentos”, finaliza.
Veja a lista das cidades credoras da Vale, por Estado:
MINAS GERAIS:
Barão de Cocais
Belo Vale
Brumadinho
Catas Altas
Congonhas
Itabira
Itabirito
Mariana
Nova Lima
Olhos D’Água
Ouro Preto
Rio Piracicaba
Sabará
Santa Bárbara
São Gonçalo do Rio Abaixo
Sarzedo
Tapira
PARÁ:
Canaã dos Carajás
Ipixuna do Pará
Paragominas
Parauapebas
GOIÁS:
Catalão
MATO GROSSO DO SUL:
Corumbá
Ladário
AMAPÁ:
Laranjal do Jari
Vitória do Jari
SERGIPE:
Rosário do Catete
Capela
Sobre a AMIG
Fundada em 1989, a AMIG é uma entidade sem fins lucrativos que tem como objetivo representar, junto aos poderes públicos, as cidades que desenvolvem atividades minerárias. Atua diretamente em defesa dos interesses e direitos dos municípios mineradores e em prol do desenvolvimento sustentável, geração de investimentos e conquista de recursos para infraestrutura, saúde, educação e preservação ambiental.