O ministro da Previdência, Carlos Lupi, mirou os bancos quando decidiu baixar na marra a taxa de juros do consignado, mas acabou acertando os bancos estatais e Roberto Campos Neto, presidente do BC, que havia semanas usufruía de relativa calmaria.
A medida reavivou as críticas no meio político de que o problema de fundo é o nível atual da Selic (13,75% ao ano). Além disso, Lupi sabia, antes de tomar a decisão, que os bancos não poderiam operar o consignado com o nível mais baixo de juros (1,7% ao mês) em razão de uma trava regulatória. Em 2013, por sugestão do BC, o CMN proibiu o setor financeiro de operar linhas de crédito com margens negativas. No patamar fixado por Lupi, nem Caixa nem BB operam no azul.
Os bancos estatais estão formalmente impedidos de seguir a ordem de Lupi. O resultado na vida real será visto na próxima terça-feira (21), quando as centrais sindicais prometem incluir o Banco do Brasil e Caixa nos protestos contra o Banco Central.
Fernando Haddad deve se reunir com o chefe da Casa Civil, Rui Costa, e com Carlos Lupi na segunda. Entre as propostas de saída em estudo, está a criação de um grupo de trabalho com a participação da equipe econômica. A queixa da Fazenda é que a decisão foi tomada pelo Conselho de Previdência, que tem seis membros do governo, todos subordinados a Lupi.
No entorno de Haddad, há queixas pela ausência de Roberto Campos Neto na querela e também para esclarecer os efeitos da crise bancária externa sobre o Brasil. O executivo está desde quarta sob sigilo pré-Copom.
Pedra no sapato
A suspensão do empréstimo consignado a beneficiários do INSS pelos bancos — após o governo reduzir o teto dos juros para 1,70% ao mês — deve levar a um aumento da inadimplência e empurrar aposentados e pensionistas para linhas mais caras, como as do crédito pessoal, que têm taxa média de 5,23% ao mês.
Em um cenário em que a população já está bastante endividada, isso afetaria diretamente o consumo e poderia até forçar os idosos a se desfazerem de patrimônio para sanar dívidas.
Para o coordenador dos MBAs em Finanças do Ibmec RJ, Gustavo Moreira, diante do alto comprometimento da renda, crédito escasso e gastos essenciais elevados, como despesas com plano de saúde, alguns aposentados podem ter que recorrer à venda de patrimônio.
“O grande problema é se desfazer do patrimônio, pagar a dívida, mas depois precisar de um novo empréstimo, que vai ser mais caro”, alerta.
Embora avalie que a redução de juros é necessária, Fabio Bentes, economista sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), critica a forma abrupta como foi feita. Segundo ele, muitas famílias usam o recurso para fechar as contas do mês. Em sua opinião, qualquer mudança no teto deve ser feita aos poucos, para evitar reação negativa dos bancos:
“No atual cenário de inflação alta, será mais uma pedra no sapato do comércio. O crédito seria uma válvula de escape, não para bombar a economia, mas para evitar uma recessão”.