Uma ex-secretária e uma vizinha que costumava cuidar de Bernardo Boldrini foram ouvidas em plenário, na tarde desta terça-feira (21), no julgamento de Leandro Boldrini, acusado da morte do filho, ocorrida em abril de 2014. A Delegada Regional de Três Passos, Cristiane de Moura e Silva Braucks, depôs pela manhã. Desde segunda-feira, já foram ouvidas quatro das 10 testemunhas arroladas por acusação e defesa.
O júri segue nesta quarta-feira (22), a partir das 9 horas, no Salão do Júri da Comarca. A Juíza de Direito Sucilene Engler Audino, titular da 1ª Vara Judicial local, preside os trabalhos.
Crimes
Leandro Boldrini responde pelos crimes de homicídio quadruplamente qualificado, ocultação de cadáver e falsidade ideológica e está sendo julgado pela segunda vez. Em março de 2019, ele foi condenado a 33 anos e 8 meses de prisão, juntamente com os outros três acusados. Uma decisão da 1ª Câmara Criminal do TJRS, em dezembro de 2021, anulou o julgamento.
O médico não esteve no plenário durante os depoimentos desta terça-feira (21) pois, pela manhã, foi solicitado atendimento médico e ele foi dispensado.
Ex-secretária
A ex-secretária do consultório de Leandro Boldrini, Andressa Wagner, foi arrolada pelas duas partes, acusação e defesa. Ela pediu que o seu depoimento não fosse transmitido pelo YouTube.
Andressa trabalhava no consultório desde 2009. Já conhecia os Boldrini antes disso, pois trabalhava na farmácia localizada na parte térrea do prédio onde funcionava o primeiro consultório de Leandro. Conheceu Graciele lá, dois meses após a morte de Odilaine, a mãe de Bernardo, que cometeu suicídio.
A ex-secretária explicou que, na época dos fatos, sofreu acusações de que teria sido ela quem escreveu a suposta carta de despedida deixada por Odilaine. A conclusão foi de um perito contratado por uma emissora de TV. Com a divulgação, Andressa acabou se mudando para outra cidade, mas seguiu sendo alvo de ataques pessoais. “Na época, fui muito falada, muito julgada. Por isso me mudei da cidade de Três Passos”, informou. “O pensamento do povo é cruel”.
Ela informou que sabia que Graciele não gostava de Bernardo. “Num primeiro instante, ela gostava dele, mas depois do nascimento da filha, mudou”. Disse que ouviu a madrasta dizer que tinha que se livrar do menino. “Ela falou que não aguentava mais o Bernardo, que tinha que internar ele. E que, ‘para dar um fim, gente para isso, tinha'”, afirmou. Isso teria sido dito quando Bernardo procurou o Juiz para reclamar da situação vivida em casa. A testemunha disse que não levou a sério a declaração e que não disse o que ouviu à Leandro.
Graciele não queria nem que Bernardo visitasse o consultório. E quando isso acontecia, ela mandava ele para casa. Já o médico não era de demonstrar emoções. Mas a relação com Bernardo era boa, na avaliação de Andressa. Ela nunca viu Graciele xingar o menino na frente de Leandro.
No dia em que Edelvania foi até o local, Graciele a apresentou como sendo madrinha da filha. Leandro não estava lá, na ocasião.
Andressa contou que já recebeu a visita de Bernardo na casa dela e também já o acompanhou em consultas médica e odontológica. O descreveu como “querido, mas ao mesmo tempo, rebelde”. “Talvez por falta de carinho e amor”, frisou.
Esclareceu que, eventualmente, Leandro deixava receitas médicas assinadas quando eram destinadas a um determinado paciente. O material ficava dentro de uma gaveta. O carimbo ficava na gaveta dela, que não tinha chave. Caso alguém tirasse uma folha do bloco do receituário, não teria como ela ter conhecimento.
Juçara Petry
Juçara Petry e o marido, Carlos, recebiam com frequência a visita de Bernardo na casa deles. Tia Ju, como era chamada pelo menino, chorou ao lembrar dos momentos juntos. Para ela, Bernardo tinha uma carência afetiva muito grande. “A gente não sabia o que fazer para ajudar. Ele não abria a dificuldade dentro de casa. Muitas vezes a gente tentava questionar e ele desviava o assunto”.
Sobre o relacionamento em casa, Bernardo não falava do pai, mas deixava claro que ele e Graciele não se gostavam. “Ele amava muito o pai e a irmã”. Já a madrasta chegou a dizer à Juçara que o enteado era “um estorvo”.
Mãe de dois filhos já adultos, Juçara passou a considerar Bernardo uma espécie de terceiro filho afetivo. O descreveu como um menino amoroso, que gostava de colo e que era muito carinhoso. O casal o ajudava nos trabalhos de aula, cuidava da sua apresentação e higiene pessoal.
Certa vez, Bernardo contou que não iria fazer a Primeira Comunhão porque não tinha roupa adequada e porque Leandro e Graciele iriam viajar, e ele não iria sozinho. Juçara o levou para comprar a roupa e foi ela quem entregou a vela ao menino. “Compramos a carne para o almoço e um bolo para celebrar”.
Durante todo o dia, Bernardo tentou ligar para o pai para contar o que aconteceu. “Ele ficou até finalzinho da tarde conosco, e conseguiu falar com o pai. O Boldrini foi buscar ele, mas já estava noite”. Páscoa, aniversário e Dia dos Pais foram algumas das datas que Bernardo passou ao lado dos Petry.
A vizinha contou que foram “inúmeras as vezes” em que ela e o esposo levavam Bernardo para casa, mas que tinham que retornar com o menino, pois ninguém atendia. “Ele (Leandro) devia estar trabalhando, mas ela (Graciele), tu via que tinha alguém em casa, só que não abria a porta para o guri”.
Juçara chorou muito ao relembrar da última vez em que encontrou com Bernardo, o júri precisou ser pausado. “Era um pedacinho meu”, afirmou emocionada. O encontro aconteceu na quarta-feira (02) antes do desaparecimento do garoto. Bernardo foi até o trabalho de Juçara, comentou que não tinha almoçado e ela deu dinheiro a ele para comprar um lanche. O garoto ainda retornou para devolver o troco. Depois disso, não se viram mais.