O catálogo de cavernas do território brasileiro ganhou quase 800 novos registros em 2022. As descobertas de pesquisadores são cavas esculpidas naturalmente pela água e que podem guardar tesouros naturais e históricos.
“Uma riqueza de bichos, as vezes únicos, de marcas marcas pré-históricas de animais e de seres humanos. Quanto mais cavernas, entende-se que tem uma maior geodiversidade preservada”, afirma Luciano Faria, espeleólogo e pesquisador.
O mapeamento foi feito pelo ICMBio, em parceria com o Centro Nacional de Cavernas, e serve para proteger o Patrimônio Nacional.
“A gente já faz um cruzamento com as bases de dados oficiais para indicar quais são as principais atividades impactantes. É possível verificar também qual o percentual das cavernas brasileiras está, de fato, conservada ou que está em risco”, diz Diego Bento, coordenador-substituto do Cecav.
Mais da metade dessas descobertas foi em Minas Gerais, o estado brasileiro com o maior número de cavernas. Agora são mais de 11 mil cadastradas. Os pesquisadores explicam que existem características no estado que favorecem essa formação natural.
“Temos diversos tipos de terrenos geológicos em Minas Gerais e todos eles são suscetíveis à formação de cavernas, e a gente também tem muita água. A água é grande a arquiteta das cavernas”, destaca Luciano.
Com as novas cavernas catalogadas, o Brasil passa a ter mais de 23 mil conhecidas, mas os pesquisadores acreditam que existam muitas outras.
Uma, em Lagoa Santa, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, é aberta ao público e tem formações raras.
“As eliquitites, que tem o formato completamente indefinido e a nossa principal raridade, que são as torres gêmeas, que são duas colunas cilíndricas – exatamente lado a lado – e que possivelmente cresceram de forma simultânea e são consideradas únicas no mundo inteiro”, conta Jonatan Lopes, monitor da gruta, falando sobre a formação do local.
Para uma dupla de amigos foi como ver os livros de geografia ganhando vida.
“Você vê isso daí: o cálcio todo pelas paredes assim, tudo formado de uma maneira natural, sem intervenção humana, sabe? É muito legal”, vibra Lorenzo da Silva, de 13 anos.
Cavernas gigantes
Túneis enormes descobertos na América do Sul por volta da chegada do século 21 não foram feitos por seres humanos, nem por processos geológicos. Segundo pesquisadores, tratam-se de paleotocas, construídas no passado por animais da megafauna extinta nesta parte do continente americano.
Até o início dos anos 2000, quase nenhuma toca atribuída à megafauna havia sido descrita na literatura científica. Mas os estudos na área avançaram: em seu estado natal, o Rio Grande do Sul, o professor de minerologia Heinrich Theodor Frank documentou pelo menos 1,5 mil paleotocas até 2017, segundo a Discover Magazine.
Em Santa Catarina, ele encontrou mais centenas dessas formações: “Nessas tocas, às vezes você tem a sensação de que há alguma criatura esperando na próxima curva – isso é o quanto que parece um covil de animais pré-históricos”.
No Rio Grande do Sul, o professor encontrou tocas que originalmente tinham centenas de metros de comprimento. Mais de 304 metros totais de túnel foram medidos em outra toca na Serra Gandarela, bem ao norte do estado de Minas Gerais. Frank também recebeu relatos de outro esconderijo pré-histórico de mais de 914 metros de comprimento em Santa Catarina.
Em 2010, o geólogo da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), Amilcar Adamy, investigou pela primeira vez rumores sobre uma dessas cavernas no sul do Brasil. Ele estava na época trabalhando em um levantamento geral em Rondônia.
Após fazer perguntas ao seu redor, o especialista encontrou o caminho para um buraco em uma encosta arborizada a alguns quilômetros ao norte da fronteira boliviana. Uma inspeção preliminar da caverna mostrou que ela não era obra de um processo geológico natural.
“Eu nunca tinha visto nada parecido antes”, disse Adamy, que resolveu voltar em 2015 ao local. “Realmente chamou minha atenção. Não parecia natural.”
Aquela acabou sendo a primeira paleotoca descoberta na Amazônia, além de uma das maiores já medidas, com túneis ramificados de cerca de 610 metros de comprimento. Os poços principais, ampliados pela erosão, tinham originalmente mais de 1,8 metro de altura e 1,5 metro de largura.
Além disso, cerca de 4 mil toneladas métricas de terra e rocha foram escavadas na encosta pelos animais para criar a toca. “Isso não foi feito por um ou dois indivíduos”, diz Adamy. “Foi feito por muitos, ao longo de gerações.”
Frank acredita que as maiores tocas foram cavadas por preguiças-gigantes, com os pesquisadores considerando vários gêneros possíveis desses animais como Catonyx, Glossotherium e exemplares Lestodon de várias toneladas.
Outros especialistas acreditam que tatus extintos como Pampatherium, Holmesina ou Propraopus, possam estar por trás das paleotocas. Mas o tatu gigante de hoje em dia cava tocas menores do que aquelas que formaram as estruturas do passado.