A ameaça inflacionária e a situação fiscal brasileira têm motivado o Banco Central manter a Selic (taxa básica de juros) em 13,75%. Desde a reunião de fevereiro do Comitê de Política Monetária (Copom) da instituição, o governo federal apresentou ao Congresso o Novo Arcabouço Fiscal, projeto que trouxe incertezas sobre a trajetória da dívida pública.
Na avaliação do presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Gilberto Porcello Petry, o mecanismo escolhido para formação de superávit primário requer aumento das receitas e não a contenção de gastos públicos, algo que preocupa, devido a seu caráter cíclico e à atual carga tributária:
“Também ficou estabelecido que o descumprimento da meta de resultado primário não configura infração, e o contingenciamento de despesas não é mais obrigatório. Por esses motivos, as expectativas inflacionárias foram elevadas”.
O dirigente observa que, mesmo com a redução observada no acumulado de 12 meses, alguns aspectos da inflação continuam a motivar apreensão – como os núcleos ainda muito acima da meta estabelecida pelo Banco Central.
Petry pondera que a atividade econômica e o mercado de crédito ainda sofrem com os efeitos dos juros altos, trazendo desafios a uma indústria nacional já tão penalizada:
“Esperamos que o governo e o Congresso façam ajustes no texto da nova regra fiscal, de modo a permitir que o Banco Central inicie, o quanto antes, o ciclo de redução da taxa. O custo às empresas está muito elevado para tomar capital de giro, empresas enfrentam problemas no País, com crédito retraído e bancos mais seletivos”.
Retomada
Relatório divulgado nesta quinta-feira (4) pela Fiergs aponta que a produção industrial voltou a crescer em março, após seis meses de oscilação entre estabilidade e quedas. O índice de produção atingiu 54,6 (em uma escala máxima de 100), valor acima da média histórica de 51,5, sugerindo um ritmo mais intenso do que a sazonalidade sugere.
Em contrapartida, a geração de emprego no setor caiu pelo sexto mês consecutivo. O índice continua abaixo de 50 pontos, mas ao atingir 49,6 (maior valor dos últimos seis meses) teve a sua baixa menos intensa do período.
“Apesar do resultado, a indefinição do cenário econômico no País provoca apreensão nos industriais e deixa o setor cauteloso em relação a investimentos para os próximos meses”, diz o presidente da Fiergs.
A utilização da capacidade instalada (UCI) cresceu de 69% para 71% entre fevereiro e março, percentual próximo do grau médio histórico do mês (70,8%). Já o índice de UCI em relação a usual subiu de 41,8 para 45,1 pontos. Está abaixo do normal em março, porém mais perto do nível de UCI usual, determinado pelos 50 pontos.
Já nos estoques, o índice de produtos finais em relação ao planejado registrou 53,3 pontos, mesmo valor de fevereiro, com um nível maior do que o previsto pelas empresas. Neste caso específico, valores superiores a 50 representam acúmulo de estoques.
A pesquisa também ressalta os maiores entraves ao setor durante o primeiro trimestre, na visão dos industriais. Como principal fator, foi apontada a demanda interna insuficiente, que voltou ao topo do ranking – posto que não ocupava desde o segundo trimestre de 2019. O índice aumentou de 30,8% para 45,5% das empresas entre outubro e dezembro do ano passado.
Com 33,3% das respostas, a taxa de juros elevada passou de terceiro maior entrave no trimestre anterior (29,7%) para segundo nos primeiros três meses de 2023. A carga tributária (principal obstáculo no período anterior, com 34,1%) foi assinalada por 28,6% das empresas, caindo para a terceira posição.
Ainda no âmbito dos três primeiros meses de 2023, os empresários revelaram que as condições financeiras se deterioraram. Em paralelo, têm enfrentado dificuldade cada vez maior para acessar o crédito.
Os entrevistados esperam crescimento da demanda neste ano, mas projetam quedas em itens como emprego, compras de matérias-primas e exportações. E mais da metade das empresas do setor pretendem realizar investimentos nos próximos seis meses.
(Marcello Campos)