Os deputados que votaram a favor do novo arcabouço fiscal, aprovado pela Câmara na última terça-feira (23) com um placar de 372 votos a 108, receberam em média três vezes mais em emendas do governo federal do que os parlamentares contrários à proposta.
Um levantamento mostra que os congressistas que ajudaram a aprovar o projeto foram contemplados com uma média de R$ 6,9 milhões entre janeiro e o dia da sessão, enquanto os demais levaram R$ 2,3 milhões no mesmo período.
Esta foi a vitória mais importante do Palácio do Planalto na Casa, onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem enfrentado problemas para arregimentar uma base fiel.
A pesquisa leva em conta 264 deputados que participaram da votação e também apresentaram emendas no ano passado, para serem liberadas em 2023. Como o Orçamento é sempre proposto e votado no ano anterior, as indicações dos parlamentares para a alocação de recursos também foram feitas pelos deputados do mandato passado. Ou seja, quem se elegeu pela primeira vez em 2022 para o Congresso não tem direito a emendas parlamentares em 2023.
As emendas individuais são de execução obrigatória, o que significa que o governo é obrigado a realizar os pagamentos. O Executivo, no entanto, pode manejar o ritmo de liberações de acordo com a agenda de interesses no Parlamento.
Deste grupo de 264 deputados, 61 deles votaram contra o arcabouço fiscal, o equivalente a 23%. Entretanto, os que rejeitaram respondem por 37% daqueles que não tiveram nenhum centavo empenhado.
O grupo ainda leva em conta alguns deputados que, na prática, são da base , como os parlamentares do PSOL e da Rede, que votaram contra o projeto — os dois partidos foram unânimes na objeção a matéria, com 13 votos. Desconsiderando esses parlamentares do grupo, a média de emendas entre os que não receberam diminui para R$ 2,1 milhões.
Leva recorde
Só no dia 9 de maio, o Planalto empenhou R$ 700 milhões para deputados e senadores. Na ocasião, os dados apontaram que a distribuição de recursos já tinha beneficiado os principais partidos aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sobretudo PSD, MDB e União Brasil, além do próprio PT. Esta leva ocorreu menos de uma semana após a primeira derrota do governo na Câmara: com o apoio de deputados da base, a Câmara derrubou trechos do decreto com alterações no marco do saneamento — o tema havia sido aprovado em lei pelo Congresso, o que gerou insatisfações.
Nas próximas semanas, existe a expectativa ainda de o governo também começar a liberação de recursos que eram do extinto orçamento secreto, mas foram repassados para os cofres dos ministérios.
Até o momento, o deputado que mais recebeu emendas individuais foi Juarez Costa (MDB-MT), que votou a favor do projeto: R$ 23 milhões. Por outro lado, entre aqueles que rejeitaram a proposta, o parlamentar mais agraciado foi Gilberto Nascimento (PSC-SP) — com R$ 12 milhões, ele é o 31º no ranking.
O valor recebido em emendas, entretanto, não é o fator que explica o voto a favor ou contra o projeto. Entre os que votaram não, boa parte se concentrou no PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro. No grupo analisado, foram 35 posicionamentos contrários.
A maioria desses parlamentares, entretanto, tem atuação notadamente ideológica, associada ao chamado “bolsonarismo raiz”, como Eduardo Bolsonaro, José Medeiros, Carlos Jordy, entre outros.
No próprio PL, o três deputados que mais receberam emendas endossaram a nova regra fiscal: Junior Lourenço (MA), com R$ 11,9 milhões; João Carlos Bacelar (BA), com R$ 10,7 milhões; e Fernando Rodolfo (PE), com R$ 10 milhões.
Maior articulação
No PP, o relator da proposta, Cláudio Cajado (BA), lidera os repasses, com R$ 15,3 milhões. O deputado Marx Beltrão (AL), outro voto a favor, vem em seguida, com R$ 15 milhões. O partido do presidente da Câmara, Arthur Lira, teve 39 votos favoráveis e sete contrários. O tema, no entanto, extrapolou as fronteiras da própria base governista, cenário que o Planalto não terá na análise de outros projetos.
“As matérias de maior interesse do governo precisarão de uma articulação maior para a vitória em plenário. Ainda há a dificuldade de não ter uma base consistente, sólida. Penso que o Congresso está dando todas as oportunidades para o governo se estruturar de uma maneira racional. O Congresso conquistou maior protagonismo. Mas é importante que o governo entenda que ele tem que participar do processo de discussão como participou o ministro (Fernando) Haddad, que ajudou muito na tramitação dessa matéria (arcabouço)”, disse Lira.
No Republicanos, sigla que se declara independente, foram 34 votos a favor e cinco contrários, patamar que o Planalto dificilmente encontrará no partido em pautas distintas deste receituário econômico, por exemplo.