A Educafro Brasil moveu uma ação civil pública contra o Google após a plataforma disponibilizar o “jogo” “Simulador de Escravidão” em sua loja de aplicativos, a Play Store, no qual o usuário pode simular ser um proprietário de pessoas escravizadas. A ONG pede que a empresa pague uma indenização no valor de R$ 100 milhões por danos morais coletivos.
O advogado especialista em direito do consumidor Leonardo Amarante, que presta consultoria à ONG — especializada na formação profissional na área digital da comunidade negra —, criticou a disponibilização do aplicativo da loja do sistema Android e considerou a oferta, por si só, uma “atitude racista”.
“Esse jogo lamentável reforça um dos capítulos mais covardes da história brasileira e viola os direitos fundamentais mais caros consagrados na Constituição Federal: as normas que protegem a honra e dignidade da pessoa humana e as normas que protegem a população negra contra o racismo”, afirmou.
De acordo com a petição aberta pela ONG, o valor de R$ 100 milhões pedido em indenização para o Google considera “a natureza in re ipsa do dano moral coletivo [quando o dano é presumido e não necessita de provas] e seu caráter punitivo-pedagógico”.
Lançado na Play Store no dia 20 de abril, o aplicativo recebeu mais de 1 mil downloads e estava disponível na plataforma até a última quarta-feira (24). Nesse mesmo dia, o Ministério Público Federal instaurou um procedimento para investigar o “jogo” e pediu esclarecimentos ao Google.
A Google afirmou que não tem nada a comentar sobre a ação da Educafro, mas, em nota, reafirmou que o jogo já foi removido da plataforma e disse que os usuário devem denunciar aplicativos que estejam em desacordo com suas políticas.
“Não permitimos apps que promovam violência ou incitem ódio contra indivíduos ou grupos com base em raça ou origem étnica, ou que retratem ou promovam violência gratuita ou outras atividades perigosas”, diz o comunicado da empresa.
“Qualquer pessoa que acredite ter encontrado um aplicativo que esteja em desacordo com as nossas regras pode fazer uma denúncia. Quando identificamos uma violação de política, tomamos as ações devidas. E, em casos graves, podemos tomar medidas mais rígidas, incluindo proibir o desenvolvedor de publicar novos aplicativos no Google Play.”
Em nota, a Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Games (Abragames) afirmou condenar quaisquer condutas, discursos ou iniciativas que ultrapassem o respeito à dignidade humana e firam a honra de indivíduos ou grupos, inclusive em jogos.
Como funcionava
A produtora responsável, Magnus Games, afirmava no aplicativo que o usuário era capaz de “trocar, comprar e vender escravos”.
“Escolha um dos dois objetivos no início do simulador do proprietário de escravos: o Caminho do Tirano ou o Caminho do Libertador. Torne-se um rico proprietário de escravos ou consiga a abolição da escravidão. Tudo está em suas mãos”, escrevia a descrição feita pela empresa.
Em uma das modalidades oferecidas, era feita a descrição: “Use escravos para seu próprio enriquecimento. Evite a abolição da escravatura e acumule uma certa quantia em dinheiro”.
A Magnus Games alega que o “jogo foi criado exclusivamente para fins de entretenimento”. “Nosso estúdio condena a escravidão em qualquer forma. Todo o conteúdo do jogo é fictício e não está vinculado a eventos históricos específicos. Todas as coincidências são acidentais”, escreve notificação do aplicativo.