Críticas sutis ao governo federal e terceirização das respostas aos questionamentos marcaram a apresentação do governador Eduardo Leite (PSDB) à Assembleia Legislativa, em Porto Alegre, nesta segunda-feira (24). O governador esteve no parlamento para apresentar os detalhes do Plano Rio Grande e do Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs), ambos voltados para a reconstrução do Estado após as enchentes de maio que atingiram mais de 450 municípios.
Reunidos no salão Júlio de Castilhos, representantes do Executivo e deputados estaduais acompanharam a apresentação do projeto. Leite falou por cerca de uma hora sobre as ações propostas pelo governo para a recuperação da economia do Estado. O governador iniciou sua fala apresentando os números da tragédia que deixou 178 pessoas mortas e atingiu 95% dos municípios do Estado.
De acordo com o levantamento do governo gaúcho, nos últimos 20 anos o Rio Grande do Sul foi o Estado brasileiro que mais sofreu danos econômicos em razão de fenômenos climáticos, os quais foram classificados pelo governo como “catástrofes naturais”. O levantamento não leva em conta as enchentes de maio, que podem se configurar como o maior desastre climático do país em termos econômicos.
As perdas até agora já são bilionárias e devem seguir durante os próximos meses, como apresentou o governador. Os cálculos do governo confirmam a perda de 17,3% na arrecadação de ICMS apenas no mês de maio: em 2023, os cofres do Estado receberam R$ 3,87 bilhões e neste ano a arrecadação caiu para R$ 3,22 bilhões.
Em junho as perdas já são maiores em termos percentuais, já que a queda na receita no mês foi 32,1%, diminuindo de R$ 2,77 bilhões em 2023 para R$ 1,88 bilhão. No acumulado entre o dia 1º de maio e 18 de junho, o Executivo perdeu R$ 1,58 bilhão em arrecadação, queda de 23,4% em comparação com o mesmo período de 2023 contando apenas com o ICMS.
Para a retomada econômica do Estado, o governo apresentou um projeto dividido em três eixos: resiliência, preparação e reconstrução. As duas primeiras etapas dizem respeito às medidas a serem tomadas antes dos desastres naturais. Entre elas estão uma nova urbanização de cidades, o projeto o RIOS: Resiliência, inovação e obras para o futuro do RS, investimento em sistema de proteção de cheias e desassoreamento de rios (quando possível).
O tema da preparação compreende a aquisição de sistemas de monitoramento mais modernos e capazes de previsões mais precisas sobre a chegada de desastres naturais. Entre as ações está a compra de um novo sistema de previsão.
Um novo radar meteorológico chegou ao Estado no dia 11 de junho, o equipamento faz parte de um processo iniciado ainda no ano passado após as enchentes que atingiram os Vales do Taquari, Caí e Sinos. O equipamento será instalado na cidade de Montenegro.
Leite também destacou a necessidade de se criar uma cultura de prevenção, para que os alertas sejam compreendidos e atendidos pela população.
Outra medida prevista é o investimento em infraestrutura e nos chamados serviços de backup, que são alternativas para estragos que venham a ser causados por novos eventos climáticos.
O terceiro eixo do programa é o que pode demandar mais investimentos diretos, pois trata da reconstrução das estruturas afetadas, sejam rodovias, pontes, prédios públicos, escolas e habitações.
Até o dia 18 de junho o governo do Estado destinou R$ 911,9 milhões para medidas de reconstrução dos locais atingidos pelas enchentes de maio. Para os próximos meses estão prevista medidas variadas como a isenção de imposto sobre doações feitas para os atingidos pelas cheias no valor máximo de R$ 100 mil.
Entre as novas medidas anunciadas aos deputados também está a ampliação do Fundo Operação Empresa do Estado (Fundopem) em impacto previsto de R$ 120 milhões. O governo também irá abrir uma linha de crédito presumido para a compra de máquinas e implementos para empresas, um impacto previsto de R$ 100 milhões.
Outras medidas são a isenção de ICMS para locadoras de veículos que venham a comprar novos veículos, além da flexibilizar o programa de parcelamento.
Medida proposta durante a discussão sobre os decretos de isenção, a transação tributária volta ao radar do governo. A medida, que deve ter um impacto de R$ 300 milhões, prevê que contribuintes com dívidas tributárias que estão sendo cobradas na Justiça cheguem a um acordo. Assim, o processo é extinto, e o devedor quita a dívida com descontos e condições especiais.
No cenário mais otimista, o Produto Interno Bruto (PIB) deve ter uma queda de R$ 115 bilhões nos próximos dois anos. Já a previsão mais pessimista do governo prevê um impacto de R$ 315 bilhões em três anos.
A presença de Leite na Assembleia, que foi até o parlamento acompanhado de toda a cúpula do Executivo, também marca a busca do governo de aproximação e facilitação para aprovação dos projetos de interesse que terão de ser votados em meio às disputas eleitorais dos municípios.
“Essa Casa toma as decisões sobre qual o percurso que vamos tomar, naturalmente o governo, o governador tem um poder importante de propor uma agenda, mas é neste parlamento que se expressa a decisão sobre o futuro do Rio Grande do Sul”, afirmou o governador em um recado e pedido direto aos deputados. Durante a apresentação, o governador também aproveitou para direcionar cobranças ao governo federal. “É o ente federativo que tem capacidade de suportar uma situação extraordinária, estados e municípios não podem emitir dívida”, afirmou em alusão à necessidade de recursos.
Juntamente com recursos, Leite também cobrou a simplificação para a liberação de recursos, bem como a flexibilização de regras fiscais.
Logo após a apresentação, o governador se retirou da Assembleia para a viagem até Brasília. Nesta terça-feira (25) ele se reúne com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Na pauta do encontro ele promete levar justamente os mesmos pedidos que apresentou aos deputados.
Mas a oposição local não deixou passar batido as cobranças ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Como previsto, os deputados fizeram questionamentos e apontamentos para os integrantes do Executivo.
Primeiro deputado a falar, Miguel Rossetto (PT), fez questão de fazer a cobrança política em nome do governo federal. “Devemos incorporar o conjuntos das iniciativas envolvidas para a reconstrução do Rio Grande do Sul, nomeadamente as ações do governo federal.”
Sem a presença de Leite, coube ao vice-governador Gabriel Souza (MDB) dar a resposta a esta e outras provocações feitas pelos parlamentares de oposição. “Temos trabalhado ombro a ombro com o governo federal, naturalmente não tenho como colocar as ações que o governo federal está planejando ou já colocou em ação”, respondeu alegando que nem mesmo a União divulga as ações do governo estadual.
Questionado sobre o tema das moradias provisórias, Souza também aproveitou para elogiar e criticar o governo federal. Ao traçar uma comparação com as medidas adotadas após as cheias do Vale do Taquari em 2023, o vice-governador elogiou a medida anunciada por Lula de comprar casas já construídas ao invés de investir em novas moradias. Contudo, o elogio não veio sem uma cobrança. “Agora o governo federal está adquirindo casas, mas sabe quantas foram entregues até o momento? Zero, neca pau, nada.”
Após as cobranças mútuas entre opositores, foi a vez de parlamentares da base do governo assumirem o microfone para defender as medidas do Executivo estadual.
Créditos do texto/imagem: Portal ABC Mais.