Aos 56 anos, um ator que frisa suas raízes brasileiras, que demonstra as multifaces encontradas em seus personagens e que tem o diálogo aberto para compartilhar histórias de vida. Matheus Nachtergaele está em Gramado, para receber na noite deste sábado (10) o Troféu Oscarito, uma das maiores honrarias do Festival de Cinema de Gramado, evento reconhecimento em toda América Latina.
Participando pelo segundo ano consecutivo – em 2023, inclusive, entrou para a Calçada da Fama -, o artista conversou com a imprensa, em encontro no Buona Vitta Resort, durante à tarde. Em pouco mais de uma hora, falou sobre seus papéis, sua carreira, percepções e como os seus personagens também trazem traços de sua própria identidade.
Para ele, o cinema brasileiro é mais legal se comparado com as produções de outros países. “No Brasil sempre é colorido, arriscado, medonho, provocador, sedutor. Acho uma loucura que o brasileiro não tenha entendido a maravilha que é o cinema daqui”, pontua.
Atualmente no ar como Norberto, da novela Renascer, Nachtergaele é um dos maiores nomes do audiovisual brasileiro. Fez papeis em grandes obras da televisão, mas também do cinema, como em Cidade de Deus, em 2002.
Mas um dos personagens mais marcantes, com certeza, diz respeito a João Grilo, em Auto da Compadecida, que ganhará um novo filme em 25 de dezembro deste ano, após duas décadas. “A gente se encontra e se perde de novo”, diz. Entre histórias com Selton Mello, ele relembra sobre o fim das gravações, há 20 anos.
“Eu não queria tirar a roupa, o figurino. Vi que estava acabando mesmo e me escondi, para poder ficar mais tempo de Grilo”, conta. Para as filmagens deste segundo filme, disse que ficou um pouco ansioso. “Receio do corpo não obedecer aos arquétipos do Grilo, as regras”, frisa.
Conforme o ator, o personagem se efetiva no contato, não apenas com os colegas de cena, mas com o público. “Os atores fazem uma dança de acasalamento, é um tesão artístico. Gravando, tem que criar um vínculo que é erótico no sentido amplo disso com a câmera. Ali que está o primeiro olhar. Quando o câmera tira os olhos depois de uma cena cotidiana e o olho dele está arregalado, tu diz foi, tu sabe que valeu. É namoro, busca de aceitação e provocação”, justifica.
O homenageado com o Oscarito ainda afirma que “o personagem começa antes, na eterna busca de se achar”.
Engana-se quem pensa que Nachtergaele apenas atua. Ele também está nos bastidores: esteve na direção de A Festa da Menina Morta. O longa foi selecionado para a mostra Um Certo Olhar, do Festival de Cannes, e venceu os prêmios de Melhor Ator, Melhor Fotografia, Melhor Música, Melhor Filme do Júri Popular e prêmio da crítica no Festival de Gramado. Também em 2008, a obra ainda arrematou os prêmios de Melhor Direção de Ficção e Melhor Ator no Festival do Rio.
“Queria mostrar meu filme aqui, eu fiz para cá, para nós. E foi linda a sessão, também saímos altamente premiados”, relembra. A lembrança, em sua memória, é inesquecível. “O primeiro prêmio foi de trilha sonora, que eu fiz ou estava sempre envolvido com algo”, diz.
“No meu mundo ideal, salas de cinema para todos os filmes brasileiros”
O futuro do cinema foi questionado por jornalistas presentes. O ator, que também já fez parte do elenco de obras para streamings, revela que, “em seu mundo ideal, haveria salas de cinema para todos os filmes brasileiros”. “Poderíamos abastecer os cinemas com nossos filmes, mas o mercado é esse, globalizado. Acredito que estamos num momento de transição, pois as pessoas estão recebendo e consumindo filmes, mas em casa”, coloca.
Nascido em São Paulo, estreou nas telonas com o clássico gaúcho Anahy de las Misiones, de Sérgio Silva, e O que é isso, companheiro?, de Bruno Barreto, que concorreu ao Oscar de Melhor Filme Internacional.
Fez sua estreia na TV Globo em 1997, na minissérie Hilda Furacão, interpretando Cintura Fina, personagem que se identificava como mulher, embora tivesse nascido com um corpo masculino, Matheus desafiava as noções de gênero vigentes. Esse papel levou reconhecimento ao ator, que viria a protagonizar a minissérie O Auto da Compadecida (1999), posteriormente lançada, em formato reduzido, para os cinemas, rendendo-lhe o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro como Melhor Ator.
Créditos do texto/imagem: Portal ABC Mais.