SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em um incidente inédito na convulsão que atinge o Oriente Médio, uma série de explosões em pagers usados por membros do grupo fundamentalista Hezbollah matou ao menos 9 pessoas e feriu 2.750 nesta terça-feira (17) em Beirute e em outras oito cidades do Líbano. Houve explosões relatadas também na Síria.
O governo e o Hezbollah acusam Israel pelo ataque engenhoso, o que é quase uma certeza, e Tel Aviv não comentou o caso. Centenas de pessoas perderam a visão, e diversas tiveram membros amputados. As estimativas de vítima são da imprensa árabe e israelense, citando autoridades de saúde locais.
Tudo começou por volta das 15h45 (9h45 em Brasília), quando as primeiras detonações foram registradas. Elas duraram, segundo testemunhas, cerca de uma hora, principalmente na capital libanesa.
Pagers são fósseis vivos tecnológicos que proliferaram nos anos 1980 e 1990. Basicamente, são receptores de mensagens curtas de texto, enviadas por centrais telefônicas. Foram para o limbo com a ascensão dos telefones celulares e do SMS e, depois, pelos aplicativos de mensagem instantânea dos smartphones.
O problema para o Hezbollah é que, desde que houve a escalada nos atritos com o Estado judeu após o início da guerra disparada pelo ataque de seu aliado palestino Hamas a Israel, há quase um ano, os smartphones se tornaram uma arma para Tel Aviv.
Como os celulares eram usados para transmitir ordens da chefia do Hezbollah a pontos de disparo de mísseis na fronteira com Israel, eles eram monitorados pelos militares rivais. Numa ligação, era possível triangular a posição de um lançador de míssil ou morteiro no sul do Líbano, que era atacado por drones ou artilharia antes de apertar o gatilho.
Ato contínuo, o Hezbollah adotou os primitivos pagers, que não são rastreáveis desta forma por não empregar sinais de satélite.
O que realmente aconteceu ainda não é sabido, mas tudo sugere que Israel, ou algum outro inimigo do Hezbollah, conseguiu implantar explosivos nos pequenos aparelhos. Segundo o jornal americano The New York Times, foram os israelenses, tendo implantado poucas gramas de bombas dentro de um lote de 3.000 pagers importados pelo Hezbollah de Taiwan.
A reportagem diz que eles foram modificados antes de chegar ao Líbano, e que a explosão ocorreria ao receber um sinal contínuo de bipes. No passado, o país chegou a matou rivais explodindo telefones celulares.
O Hezbollah determinou uma investigação daquilo que chamou de "maior falha de segurança" em sua história recente.
O ataque ocorre em um momento crucial na política israelense, com a provável troca do ministro da Defesa, Yoav Gallant, e a pressão de Netanyahu para uma ação mais decisiva contra o Hezbollah após seu ano de guerra na Faixa de Gaza. Nesta terça, o premiê colocou a volta das pessoas removidas da fronteira com o Líbano como uma prioridade militar.
Pelo menos 2.750 pessoas ficaram feridas em várias cidades, afirmou o ministro da Saúde do Líbano, Firass Abiad. Aproximadamente 200 foram hospitalizadas em estado grave. Explosões de dispositivos ocorreram também na Síria, onde ao menos 14 pessoas foram atingidas.
Em comunicado, o Hezbollah disse que os equipamentos pertenciam a "trabalhadores em várias unidades e instituições do grupo". Ainda é incerto quantos dos mortos e feridos pertencem à organização. O grupo disse que o líder, Hassan Nasrallah, não foi atingido, e o governo libanês pediu que todos os cidadãos joguem fora seus pagers.
A agência de notícias Mehr, do Irã, divulgou que o embaixador do país no Líbano, Mojtaba Amani, foi ferido em uma das explosões. A informação não pôde ser verificada de forma independente.
Segundo serviços de saúde, além das mãos, as explosões causaram ferimentos nos olhos e nas pernas. O jornal Times of Israel estima em 500 as pessoas que perderam a visão. A ação também provocou amputações, segundo médicos que atendem as vítimas. Vários grupos de pessoas se aglomeraram na entrada de hospitais para checar se seus familiares estavam entre os feridos.
"As agências competentes do Hezbollah estão fazendo uma ampla investigação científica e de segurança para determinar as causas que levaram às explosões", disse o grupo, em nota.
Até aqui, as tensões entre Israel e Hezbollah se mantêm altas, mas não desandaram para uma guerra porque isso não é do interesse imediato de ninguém, a começar pelo padrinho do grupo libanês, o Irã.
As tensões aumentaram em julho, após a morte do comandante do Hezbollah, Fuad Shukr, em um ataque de Israel que atingiu um edifício em Beirute. No dia 25 de agosto, o grupo disse ter iniciado sua reação com um grande ataque de foguetes, sem grande consequência militar, que foi antecipado por uma ação preventiva de Tel Aviv.
Também em julho, Ismail Haniyeh, o líder do Hamas, foi assassinado na explosão de um dispositivo que havia sido plantado em uma casa de hóspedes mantida pelo regime iraniano na capital, Teerã, onde ele estava alojado.
Maior aliado de Israel, os Estados Unidos negaram envolvimento nas explosões dos pagers. "Posso dizer a vocês que os EUA não tinham conhecimento prévio sobre este incidente e que, neste momento, estamos reunindo informações", disse o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller.
Créditos: Portal R7.