Com apenas uma informação, os jogadores do Palmeiras que tiveram prejuízo milionário ao investirem em uma empresa de criptomoedas poderiam ter evitado a dor de cabeça: a promessa de lucro de 5% ao mês, garantida em contrato, está completamente fora da realidade dos principais produtos financeiros disponíveis no mercado.
O meia Gustavo Scarpa (atualmente no Nottingham Forest FC) investiu R$ 6,3 milhões em criptomoedas, em uma aplicação indicada por Willian Bigode (atualmente no Fluminense). Um lucro de 5% ao mês seria o equivalente a quase 80% ao ano — quase seis vezes mais do que a taxa Selic, que é referência para os juros no País.
“Quando a gente fala de investimentos, tudo que vai acima da taxa Selic começa a ter risco. Quanto maior é a rentabilidade possível, maior a possibilidade de perda. O risco é isso: tem chance de ganhar e tem muita chance de perder”, explica Thiago Godoy, educador financeiro da Rico.
Modalidades
Scarpa poderia ter rendimentos próximos de R$ 1 milhão ao ano com uma carteira de investimentos conservadora e bastante segura.
Dentro dos títulos de renda fixa, há três divisões principais e que costumam ter rentabilidade atrelada à Selic, à inflação pelo IPCA ou por uma taxa prefixada. Em todos, os juros pagos ao investidor não fogem do patamar dos juros básicos do país.
O Tesouro Selic ou títulos de renda fixa atrelados ao CDI rendem próximos à taxa básica de juros, hoje em 13,75% ao ano. Os títulos vinculados ao IPCA costumam pagar a inflação do período mais um extra de 6% a 8% — que também não passam dos 15%. Os prefixados também rondam esse degrau e pagam as taxas prometidas no momento de investir.
A única possibilidade de buscar taxas mais altas é partindo para a renda variável. Mas especialistas fazem questão de frisar que a rentabilidade anterior desses ativos não pode ser usada como garantia de algo similar no futuro. Ou seja: é possível que uma ação na bolsa, por exemplo, valorize 5% em um mês (ou 80% em um ano). Mas é impossível assegurar que fará o mesmo no ano seguinte.
“Isso pode acontecer durante um período, com uma ou outra empresa. Por isso que a gente sempre fala sobre a diversificação de investimentos: uma empresa que valoriza muito é ótimo, mas ela pode desvalorizar muito mais do que isso. Um exemplo muito recente disso é a Magazine Luiza”, explica o educador.
Rendimentos
Um levantamento feito pelo Trademap mostra que os rendimentos nos últimos 12 meses das principais aplicações estão longe da cifra prometida no golpe. O recorte da análise foi feito dentro da janela de 12 meses – comparativo mais usual dentro do mercado.
O CDI, título emitido por instituições financeiras para equilibrar as operações entre os bancos, teve rentabilidade de 13,01% nos 12 meses terminados em fevereiro. A poupança também registrou rentabilidade positiva no período, de 8,18%.
Ativos que tiveram uma supervalorização são exceções no mercado. Um exemplo são os papéis da companhia Cielo, que valorizaram mais de 105% nos últimos 12 meses. Mas é a única ação do Ibovespa que valorizou acima do patamar prometido no caso do golpe contra os jogadores do Palmeiras. Além disso, a Cielo acumula queda de 2,63% em 2023.
Mau momento
Parte da explicação para esse mau momento dos ativos de renda variável é o reflexo do sentimento de aversão ao risco que tomou os mercados nos últimos anos. Ele é fruto principalmente da crise econômica decorrente das medidas restritivas da covid e foi intensificado com a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Esse cenário se refletiu na subida de juros nas principais economias do mundo, principalmente dos Estados Unidos. O Federal Reserve (Fed) fez sucessivos aumentos ao longo de 2022 e a taxa de juros americana passou de 0,25% ao ano em janeiro de 2022 para o intervalo de 4,25% a 4,5% ao ano em dezembro.