A decisão do governo ontem de reduzir o teto de juro do consignado de 2,14% para 1,70% ao mês assustou os bancos que operam com o produto. Segundo participantes da indústria, mesmo os 2,14% já estavam apertados e a nova taxa praticamente torna impossível a distribuição por terceiros – os famosos pastinhas -, o que pode levar a uma redução forte da oferta.
“O governo se mobilizou muito rápido e a nova taxa veio muito abaixo do razoável. Com certeza não dá para pagar canal terceiro, acho que inviabiliza para quase todo mundo”, diz o CEO de um banco de médio porte. Ele diz que, com uma taxa de 22% ao ano no consignado, tirando Selic + spread (16%), mais óbitos dos tomadores (3%), mais custos de averbação de garantia (1%), sobram cerca de 2%, dos quais ainda é preciso descontar a comissão dos terceiros e, do que sobrar, 4,65% de PIS/Cofins e 45% de IR/CSLL.
Para outro executivo, “foi uma decisão sem muito argumento técnico e feita de forma atropelada”. “Se for realmente em frente, deverá afetar de maneira relevante a oferta do produto no mercado”, comenta. “O governo não tem ideia das consequências, isso inviabiliza a maior parte das operações”, assevera outro participante do mercado.
O presidente da Associação Nacional dos Profissionais e Empresas Promotoras de Crédito e Correspondentes no País (Aneps), Edison João Costa, afirma que não cabe aos promotores opinar sobre taxa de juros, mas admite que a taxa muito baixa afeta o equilíbrio econômico-financeiro da operação. “Olhando o custo do dinheiro e levando em conta as perdas, provisões, fraudes, realmente fica muito difícil. Muitos bancos já me falaram que, com essa taxa, não tem como manter os correspondentes, e somos nós que atendemos mais de 50% do público de baixa renda.”
Ele diz que o mais sensato seria o governo aprovar a nova taxa, mas esperar para ver qual será a posição do Banco Central na próxima reunião do Copom, se haverá alguma sinalização de queda de juros. “Não adianta reduzir os juros assim e destruir o canal de distribuição.”
BTG
Em relatório, o BTG diz que a redução da taxa é uma notícia ruim para o setor bancário. “Mesmo com os jornais locais já sinalizando que uma redução do teto poderia estar no horizonte, com base em nossas interações recentes com diversos players do mercado, a magnitude do corte foi maior do que o esperado.” Segundo os analistas, a nova taxa reduz a lucratividade dos bancos e pode diminuir o apetite por ofertar crédito, principalmente se as taxas de captação/Selic permanecerem altas por mais tempo.
O Citi calcula que a nova taxa reduz o spread nas operações de consignado de cerca de 13% para 8%. “Acreditamos que tal mudança pode aumentar o ruído em outros potenciais tetos de taxa de juros, como é o caso dos empréstimos de cartão de crédito, o que pode pesar nas ações dos bancos.”