O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está decidido a devolver aos militares a responsabilidade por sua segurança. pessoal e a de familiares. Entretanto, como ele não quer entrar na briga entre membros do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e da Polícia Federal (PF), deve apenas deixar caducar a medida que criou a Secretaria Extraordinária de Segurança Imediata. O órgão será extinto automaticamente depois de 30 de junho.
Lula foi convencido de que com a sua segurança pulverizada, dividindo funções entre militares e federais, ele não saberá nem a quem demitir se houver algum problema. De acordo com fontes ligadas ao Palácio do Planalto, faltava o presidente convencer a primeira-dama, Janja da Silva, que não se sente confortável cercada de militares.
Desde a transição de governo e, principalmente, depois dos atos extremistas do dia 8 de janeiro em Brasília, o casal presidencial deixava clara a desconfiança em relação a parte dos membros das Forças Armadas, devido a uma questão bastante óbvia: a ligação deles com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Esse clima teria começado a mudar após a enxurrada de demissões no GSI, no mês passado, para que fossem retirados os bolsonaristas da estrutura.
Um dos ministros do “núcleo duro” da gestão petista avalia, porém, que o processo de abertura para uma relação de confiança começou antes: “O marco temporal da nova relação de Lula com os militares foi a mudança no comando do Exército, quando assumiu o general Tomás Miguel Paiva”.
Trama contra a democracia
Uma reportagem publicada nesta semana no Estadão revelou o incômodo da cúpula do Exército com os militares bolsonaristas suspeitos de tramar um golpe contra a democracia. Com base em fontes no círculo “fardado”, generais se referem aos acusados de golpismo com a palavra “deslealdade” – um eufemismo para “traição”, a máxima desonra para um militar.
Multiplicam-se as evidências que apontam para uma ação orquestrada. A Polícia Federal se debruça sobre o caso –trechos do relatório dos investigadores foram publicados nesta semana pelo jornal “O Globo”.
Áudios e mensagens trocados entre militares mencionam uma certa “operação” – segundo a PF, “um codinome para a execução de um golpe de Estado que culminaria na tomada de poder pelas Forças Armadas”.
“De fato, houve uma tentativa de golpe e isso agora está muito claro, não apenas pelo 8 de janeiro mas por tudo o que foi descoberto desde então”, diz o cientista político Octavio Amorim Neto, professor titular da Fundação Getulio Vargas (FGV) e um dos maiores especialistas brasileiros no assunto.
Ele conta que as evidências de golpe não surpreendem os analistas, que alertaram para a excessiva presença fardada no governo Bolsonaro: “Colocar militares no centro de um regime democrático é instalar a ameaça de uso da força física como base para se fazer política. Isso parecia ambíguo no início do governo, e no final se tornou explícito. Era uma tragédia anunciada”.