O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu na manhã dessa sexta-feira (26) com as ministras Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança do Clima, e Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas. A reunião ocorreu após uma ofensiva do Legislativo contra a agenda de proteção ambiental e de povos tradicionais.
Nos últimos dias, os parlamentares retiraram atribuições dos ministérios comandados por Marina e Sonia Guajajara, aprovaram uma medida provisória que afrouxa regras de proteção da Mata Atlântica e deram aval para que tramite em regime de urgência um projeto que pode dificultar a demarcação de terras indígenas.
A decisão do presidente Lula de receber as ministras em seu gabinete tem o objetivo de reduzir a insatisfação de Marina Silva e evitar que a ministra eventualmente deixe o cargo. Marina é considerada um trunfo do governo no cenário internacional por sua experiência na área.
Esta será a primeira vez que o presidente atuará pessoalmente para arbitrar a crise. A ideia, segundo fontes que participam da reunião, é prestigiar as duas ministras e mostrar que Lula continua considerando como prioridade em seu governo os temas tratados pelos seus ministérios. Mas o presidente não deve prometer que o governo conseguirá reverter as mudanças no Congresso.
A avaliação é a de que se o Planalto desafiar o Congresso, a medida provisória que trata da organização do governo, hoje com 37 ministérios, pode caducar. Se isso acontecer, a estrutura do governo de Jair Bolsonaro (PL), composta por 23 pastas, voltaria a vigorar. Ministros e emissários do governo devem, ao longo dos próximos dias, manter diálogo com parlamentares para tentar mitigar pontos do relatório que possam ser “repensados” até semana que vem.
MP
O texto que tramita no Congresso tira do ministério comandado por Marina o controle do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e da Política Nacional dos Recursos Hídricos. O CAR vai para o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e a política de recursos hídricos, para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional.
O relatório prevê ainda que a demarcação de territórios indígenas, hoje responsabilidade do Ministério dos Povos Indígenas, chefiado por Guajajara, seja atribuição do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Marina vem criticando duramente a proposta contida no relatório, dizendo que o Congresso está tentando transformar o governo Lula no governo de Jair Bolsonaro, atacado pelo petista durante a campanha pelo desmonte dos órgãos de combate ao desmatamento e falta de comprometimento com o desenvolvimento sustentável.
“Nós temos um Congresso. Eles estão transformando a medida provisória da gestão do governo que ganhou na medida provisória do governo que perdeu em várias agendas, sobretudo, na agenda ambiental e dos povos indígenas. Mas nós temos que resistir e vamos resistir manejando essas contradições, criando alternativas, buscando soluções e cuidando do legado. O presidente Lula ganhou e como legado da democracia nós fazemos parte desse legado”, disse a ministra.
Marco temporal
Na quarta-feira (24), o plenário da Câmara dos Deputados aprovou um requerimento para que tramite em regime de urgência um projeto de lei que pode mudar o sistema de demarcação de terras indígenas. Isso porque pode criar um marco temporal para a demarcação, entre outras alterações.
A urgência permite que o texto seja analisado diretamente em plenário, sem ter que passar por mais comissões da Casa. O projeto havia sido aprovado com alterações pela Comissão de Agricultura, em 2008, e pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em 2021. No entanto, foi rejeitado pela Comissão de Direitos Humanos em 2009.
“O marco temporal é um genocídio legislado. Uma teoria que inverte toda história do Brasil. Um projeto de lei que atenta contra constituição brasileira. Um atentado ao direito dos povos Indígenas. Um ataque à nossa maior possibilidade de enfrentamento da crise climática, as TIs [terras indígenas]”, rebateu Guajajara.
Ibama x Petrobras
Enquanto o texto que trata da estrutura do governo era elaborado no Congresso, o Ibama rejeitou na semana passada um estudo da Petrobras para perfurar um poço para pesquisar a existência de petróleo no litoral do Amapá. O instituto justificou sua decisão afirmando que a Petrobras não apresentou garantias para a fauna local em caso de acidente e nem para eventuais impactos em comunidades indígenas.
A Petrobras declarou que cumpriu todos os requisitos impostos pelo Ibama no processo de licenciamento e explicou que a área que pretende explorar está a 175 quilômetros da costa do Amapá e a mais de 500 quilômetros da foz do rio Amazonas.
Marina Silva sustenta que a decisão do Ibama foi técnica e que deve ser respeitada. De acordo com ela, a Petrobras pode a qualquer momento fazer uma nova solicitação de licença, mas a estatal precisaria realizar um novo estudo, mais abrangente, chamado de avaliação estratégica ambiental.
A Petrobras já informou em um parecer enviado ao Ibama que não vê exigência legal para o estudo. Segundo Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama, o instituto pediu para a Petrobras oito vezes complementações nos estudos e não foram suficientes para comprovar a viabilidade do projeto.