Shinzo Abe foi o primeiro-ministro mais longevo do Japão e resistiu a vários escândalos políticos e financeiros. Ele morreu nesta sexta-feira, 8, após ser vítima de um ataque a tiros quando participava de um evento de campanha, no qual fazia um discurso para uma eleição parlamentar, quando foi atingido no pescoço. O ex-premiê foi um líder nacionalista da terceira geração, e durante oito anos, de 2012 a 2020, procurou reaquecer a economia japonesa e restaurar parte do militarismo e do orgulho do país.
Abe tinha 52 anos quando assumiu o cargo de primeiro-ministro em 2006 e se tornou a pessoa mais jovem a ocupar a posição. Seu primeiro mandato foi turbulento, marcado por escândalos e disputas, e terminou com sua renúncia abrupta após um ano. Na ocasião, ele alegou ter tomado essa decisão por motivos políticos, mas depois acabou admitindo ter um problema de saúde, mais tarde diagnosticado como colite ulcerativa. O tratamento durou meses e só foi possível graças a um novo medicamento, conforme relatou o ex-premiê. Curado, em dezembro de 2012 voltou a ser candidato e retornou ao cargo de primeiro-ministro como um salvador do país. Sua vitória encerrou um período turbulento em que os primeiros-ministros se sucediam ao ritmo de até um por ano.
Seu governo ganhou ainda mais a confiança do povo após saber lidar com os efeitos do tsunami ocorrido em 2011 e o desastre nuclear de Fukushima. No cenário internacional, Abe ficou famoso por sua estratégia de recuperação econômica, conhecida como “Abenomics”, onde misturava a flexibilização monetária, grande recuperação orçamentária e reformas estruturais. Essas iniciativas possibilitaram aumento da taxa de emprego de mulheres e idosos. O país também passou a recorrer à imigração, de maneira mais intensa, para enfrentar a escassez de mão de obra. Contudo, o programa não durou muito e foi ofuscado pela crise econômica provocada pela pandemia de coronavírus.
Abe era considerado um símbolo de mudança e juventude e apresentava o pedigree de um político de terceira geração, preparado desde cedo para exercer o poder dentro de uma família conservadora de elite. Ele tinha como grande ambição revisar a Constituição pacifista do Japão de 1947, redigida durante a ocupação por parte dos Estados Unidos, e nunca alterada. Durante seu mandato, Abe adotou uma política de linha dura com a Coreia do Norte, mas assumiu um papel de pacificador entre EUA e Irã. Ele priorizou um relacionamento próximo com o então presidente americano, Donald Trump, para proteger a relação entre os dois países do nacionalismo do empresário republicano, ao mesmo tempo em que tentou ajustar os laços com Rússia e China. Os resultados foram misto. Abe não conseguiu concretizar um acordo com a Rússia sobre ilhas em disputa. O mesmo aconteceu com seu plano de convidar o presidente chinês, Xi Jinping, para uma visita de Estado.
Muitas vezes atingido por escândalos que afetaram pessoas próximas, o ex-premiê soube aproveitar os acontecimentos externos – como lançamentos de mísseis norte-coreanos e desastres naturais – para desviar a atenção e se apresentar como um líder indispensável diante das adversidades. Ele também foi beneficiado pela falta de um adversário do mesmo porte dentro de seu partido, o PLD (Partido Liberal Democrata), e pela fragilidade da oposição, que ainda não se recuperou de sua passagem desastrosa pelo governo entre 2009 e 2012. Abe deixou o poder em 2020 depois de ser obrigado a deixar o posto de chefe de Governo por problemas de saúde. Aos 67 anos, ele faleceu em um hospital de Kashihara poucas horas após ser sido atingido por tiros durante um comício eleitoral em plena rua em Nara, na região oeste do Japão.