O conflito entre Rússia e Ucrânia chegou ao sexto mês no domingo, 24. Pela primeira vez desde que as tropas de Vladimir Putin invadiram o Leste Europeu, os russos admitiram publicamente que tem interesse em derrubar o governo de Volodymyr Zelensky. “Russos e ucranianos vão continuar vivendo juntos, e nós certamente iremos ajudar o povo ucraniano a se livrar do regime”, afirmou o chanceler russo, Sergey Lavrov, durante uma cúpula da Liga Árabe no Cairo. Ele também declarou que Moscou está determinada a ajudar os vizinhos a “se livrarem do fardo desse regime absolutamente inaceitável”.
Desde que lançou a operação especial na Ucrânia, Putin sempre disse que a intenção era desmilitarizar e desnazificar o país, além de evitar a aproximação com o Ocidente – o qual Lavrov voltou a acusar de ter influenciado os ucranianos a se revoltarem contra a Rússia com o objetivo de provocar a guerra. Entretanto, nos primeiros dias rumores apareceram sobre o interesse de destituir Zelensky do cargo, visto que três dias após a invasão, havia soldados russos na periferia de Kiev. Contudo, as tropas de Putin não conseguiram dominar a região e acabar com o governo. No final de março, o líder russo designou que suas tropas focassem no objetivo que até então era o principal, assumir a região de Donbass.
Antes de declarar o interesse em derrubar o governo de Zelensky, Lavrov já havia dito que os planos da Rússia mudaram e que agora vão além de Donbass. “Quando as negociações foram realizadas em Istambul, tínhamos uma geografia, e nossa disponibilidade para aceitar a proposta ucraniana foi baseada nessa geografia”, afirmou Lavrov em uma entrevista à agência de notícias russa RIA Novosti. “Mas, agora é diferente”, acrescentou. O ministro declarou que “não se trata mais apenas das repúblicas populares de Donetsk e Luhansk”, também envolve a “região de Kherson, Zaporizhzhya e uma série de outros territórios”. Atualmente, as tropas russas dizem dominar a região de Luhansk, mas a Ucrânia não confirma essa informação.
No mesmo dia das declarações de Lavrov, a Rússia também admitiu que foi a responsável pelo ataque com mísseis no porto de Odessa, horas depois de assinar um acordo para que grãos ucranianos que estão presos desde o início do conflito fossem exportados e evitasse uma escassez alimentar mundial. “Mísseis de longa distância e de alta precisão lançados no mar destruíram um navio militar ucraniano ancorado no porto e caixas de mísseis antinavio entregues pelos Estados Unidos ao governo de Kiev”, disse o Ministério da Defesa russo. O acordo negociado sob os auspícios do presidente turco Recep Tayyip Erdogan e do secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, estipula que Odessa é um dos três centros de exportação de grãos designados para que os navios possam transitar por corredores seguros no Mar Negro. No entanto, o ataque coloca em risco este acordo histórico assinado após meses de negociações, e que poderia aliviar a crise alimentar mundial.
Após o ataque, Zelensky afirmou que o diálogo com o Kremlin era cada vez mais insustentável e que a capacidade de Moscou de cumprir suas promessas não eram confiáveis. Aproximadamente 20 milhões de toneladas de trigo e outros grãos estão bloqueados nos portos ucranianos, especialmente Odessa, por navios de guerra russos e minas colocadas por Kiev para evitar um ataque anfíbio. O acordo selado em Istambul no dia 22 de julho é o primeiro grande acordo entre as partes do conflito desde a invasão russa em 24 de fevereiro e era aguardado com ansiedade para ajudar a aliviar a fome que, segundo a ONU, mais 47 milhões de pessoas enfrentam devido à guerra.
Apesar do ataque, a Ucrânia declarou, nesta segunda-feira, 25, que espera retomar esta semana a exportação de grãos pelo Mar Negro pela primeira vez em cinco meses de guerra. “Esperamos que o acordo comece a funcionar nos próximos dias e esperamos que se estabeleça um centro de coordenação em Istambul nos próximos dias. Estamos preparando tudo para começar esta semana”, declarou o ministro ucraniano de Infraestrutura, Oleksandr Kubrakov, em entrevista coletiva. Segundo o ministro, o principal obstáculo para a retomada das exportações é o risco de bombardeios russos, como o ataque de sábado. Nesse sentido, Kubrakov pediu à Turquia e à ONU, mediadores do acordo, que garantam a segurança dos comboios ucranianos. “Se as partes não garantirem a segurança, não vai funcionar”, advertiu o ministro, acrescentando que a desminagem será feita apenas “no corredor necessário para as exportações”.
*Com informações da AFP