Com dificuldade de deslanchar o governo e após enfrentar uma série de crises, o presidente Lula aumentou a pressão para que seja feita uma varredura em cargos de confiança para identificar servidores alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro na máquina pública federal. Na última terça-feira (14), o petista disse que ainda não conseguiu montar algumas equipes porque precisava “tirar bolsonaristas que estão infiltrados às pencas”.
Na mira de Lula estão apoiadores de Bolsonaro, militares alinhados com a gestão anterior e defensores da Operação Lava-Jato. O titular do Palácio do Planalto fez uma cobrança pública ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, ao afirmar que é responsabilidade do auxiliar mapear os adversários internos. Segundo a pasta, ainda não há dados consolidados sobre o número de exonerados.
Um dos casos de veto é o da chefia da Defensoria Pública da União (DPU). Lula conseguiu travar o processo de recondução de Daniel de Macedo para o comando do órgão.
Evangélico, Macedo foi indicado por Bolsonaro a partir da lista tríplice apresentada pela categoria. Porém, o PT vê com reservas o comportamento da DPU durante o governo anterior. Uma das ações criticadas pelo partido foi quando a defensoria acionou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para impedir a realização de um ato de repúdio a Bolsonaro por ter dito que “pintou um clima” com adolescentes venezuelanas. Macedo fez parte das 18 indicações encaminhadas por Bolsonaro ao Senado e revogadas por Lula — havia ainda nomes para agências reguladoras e embaixadas, todos barrados.
“Vocês têm que ter um pouco de paciência, porque estamos há 40 dias no governo. A gente ainda nem conseguiu montar as equipes, porque nós temos que tirar bolsonaristas que estão infiltrados às pencas”, disse Lula na terça, durante evento em Salvador (BA) para o relançamento do programa Minha Casa, Minha Vida.
A trava mais recente ocorreu na Câmara de Comércio Exterior (Camex). Foram exonerados ontem o ex-comandante da Marinha Almir Garnier dos Santos e o ex-ministro de Ciência e Tecnologia Marcos Pontes, que atualmente é senador. No lugar deles, foram designados dois economistas ligados ao PT: Rodrigo Alves Teixeira e Bruno Moretti.
Durante a campanha, uma das promessas do petista foi a de desmilitarizar o governo, retirando integrantes das Forças Armadas nomeados por Bolsonaro. Já no primeiro dia de seu mandato foram exonerados militares que estavam em ministérios como o da Saúde e do Meio Ambiente.
No fim de janeiro, o comandante do Exército, Tomás Paiva, barrou a nomeação do tenente-coronel Mauro Cid para o comando de um batalhão de operações especiais em Goiânia. Cid foi ajudante de ordens do ex-presidente e é investigado em inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF). A cobrança pelo freio à promoção de Cid, um dos mais influentes assessores de Bolsonaro, foi um dos motivos que levaram o ex-comandante do Exército Júlio César Arruda a ser demitido por Lula — o general resistia a barrá-lo.
Um dos órgãos que despertam mais desconfiança em Lula é o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que era comandado pelo general Augusto Heleno, próximo de Bolsonaro. O sentimento se intensificou após os atos extremistas de 8 de janeiro. Lula chegou a acusar as forças de segurança de conivência com a invasão do Planalto. O presidente exonerou mais de 80 militares do GSI.
Após os atos em Brasília, o governo trocou ainda o número dois da pasta, general Carlos Penteado, remanescente da gestão Heleno. Além disso, o oficial, assim como o general Heber Portella, próximo ao ex-ministro Braga Netto, não foi promovido pelo Exército para o posto de general quatro estrelas. Os movimentos foram interpretados como sinais da cúpula da Força para amenizar desgastes com o Planalto.
Foco na PRF
Outras trocas ocorreram na Comissão de Ética Pública da Presidência. Lula dispensou Célio Faria Júnior, que foi chefe de gabinete de Bolsonaro e ministro-chefe da Secretaria de Governo; João Henrique Nascimento de Freitas, ex-assessor especial do ex-presidente; além do secretário estadual de Justiça em São Paulo, Fábio Prieto de Souza. Uma das vagas passou a ser ocupada pelo advogado Manoel Caetano, figura da confiança do presidente, a quem visitava no período da prisão em Curitiba.
Cargos que estão sob o guarda-chuva de ministérios também são analisados com lupa. Inicialmente escolhido pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, para ser o novo diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Edmar Camata acabou sendo preterido após vir à tona que ele havia feito críticas a Lula e era entusiasta da Operação Lava-Jato.
A PRF, aliás, é um dos focos da força-tarefa de “desbolsonarização” do governo: 26 dos 27 superintendentes regionais foram trocados. A Polícia Rodoviária Federal ficou marcada pelas blitzes em estradas, sobretudo do Nordeste — reduto de eleitores lulistas — realizados no segundo turno das eleições do ano passado.