Com a explosão dos influenciadores digitais de finanças, um novo golpe financeiro começou a se alastrar como uma praga. Os golpistas criam contas falsas no Instagram, fingindo ser produtores de conteúdo conhecidos, e enviam mensagens privadas oferecendo investimentos milagrosos. Então, seguidores depositam dinheiro achando que serão ajudados a investir por gurus e não conseguem recuperar o recurso – e as denúncias não impedem que os perfis falsos se proliferem.
Os influenciadores digitais se tornaram uma das principais fontes de informação sobre investimentos no Brasil. O país tinha 255 produtores de conteúdo assim, com 94,1 milhões de seguidores no Facebook, Instagram, Twitter e YouTube, no primeiro semestre de 2022, conforme um estudo da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) em parceria com o Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (IBPAD).
À medida que o engajamento dos brasileiros com os influenciadores de finanças aumenta, os golpistas ganham terreno. Até agora, eles seguem um roteiro padrão: criam uma conta no Instagram com o mesmo nome dos produtores de conteúdo, mudando apenas algum caractere.
Como os golpistas compram seguidores para ter um grande número e copiam as fotos e as postagens, fica difícil desconfiar que aquele perfil é falso. Então, eles pedem para seguir as pessoas e enviam mensagens privadas oferecendo investimentos com altos retornos. São criptoativos em sua maioria, mas os investimentos podem mudar.
Os influenciadores contam que jamais enviam mensagens aos seguidores, muito menos oferecendo investimentos. Eles costumam denunciar as contas falsas ao Instagram, mas dificilmente a plataforma derruba os perfis.
Geralmente, a rede social envia mensagens afirmando que não conseguiu analisar a denúncia devido ao grande volume de queixas recebidas, ou dizendo que não pode remover a conta porque o conteúdo não viola as diretrizes da comunidade. Nas poucas vezes em que o Instagram derruba as contas falsas, em seguida outras aparecem.
Arthur Vieira de Moraes, professor e palestrante dedicado a fundos imobiliários e sócio do Clube FII, já registrou 20 contas falsas no Instagram em seu nome nos últimos seis meses e costuma alertar os 36,7 mil seguidores no Instagram. “Como professor, eu apenas ensino como os investimentos funcionam, mas não analiso, recomendo ou vendo produtos”, afirma.
Assim como muitos influenciadores de finanças, ele já denunciou as contas falsas incontáveis vezes e pediu ao Instagram para ter a conta verificada com o selo azul, para facilitar a identificação do perfil verdadeiro, mas os pedidos foram negados. “Denunciar as contas falsas é como enxugar gelo. Cada vez mais aparecem perfis falsos de influenciadores de investimentos bons e sérios. Está desesperador, ninguém sabe mais o que fazer”, diz.
Eduardo Mira, analista e professor de investimentos e influenciador com 403 mil seguidores no Instagram, conseguiu ter a conta verificada com o selo azul em janeiro, após anos pedindo. Ele conta que os relatos de pessoas que perderam dinheiro com golpes em seu nome diminuíram depois disso.
“Os golpistas chegavam a criar três perfis falsos por mês em meu nome. A maioria dos meus seguidores são leigos em investimentos e, por isso, são alvos fáceis. Aqueles que pensam em ganhar dinheiro a qualquer custo sem entender o que estão fazendo acabam ficando cegos”, afirma. “Muitas pessoas caíram em golpes, ficaram bravas comigo e me pediram ressarcimento, tamanho o desespero, mas eu também sou vítima”, diz.
Alguns influenciadores chegaram a entrar na Justiça contra a Meta, dona do Instagram, porque a plataforma não derrubou as contas falsas após as denúncias, e ganharam os processos. Foi o que aconteceu com José Eduardo Daronco, analista de ações da Suno Research, advogado e influenciador com 10 mil seguidores no Instagram. A Justiça determinou que a rede social retirasse os perfis falsos do ar, sob pena de multa.
“Os culpados são os criadores das contas falsas, que cometem crime de estelionato, e o Instagram, que tem o dever de derrubar esses perfis. A Justiça entende que existe uma relação de consumo entre as plataformas e os influenciadores e seguidores e que as redes sociais têm o dever de impedir que os seus usuários sejam molestados”, afirma.
O que fazer
Ione Amorim, coordenadora de serviços financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), adverte que os influenciadores de finanças oferecem apenas conhecimento, de graça ou pago. Assim, ela alerta que as pessoas não devem contratar produtos ou serviços de investimentos oferecidos por alguém em uma rede social, sem checar qual instituição financeira está por trás e se ela tem autorização para funcionar.
“Já aos influenciadores de finanças, aconselho formar uma associação para ganhar força como classe que faz um trabalho sério de educação financeira”, afirma. Esse problema é tão novo que influenciadores e seguidores ainda desconhecem como buscar ajuda. Afinal, é caso para procurar a polícia, as redes sociais ou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), reguladora do mercado de capitais?
Ester Borges, coordenadora de pesquisa no InternetLab, orienta que os influenciadores e as pessoas que sofrerem com os golpes financeiros nas redes sociais abram um boletim de ocorrência em uma delegacia de crimes cibernéticos. Essas denúncias são importantes para a polícia contabilizar os casos e investigar e punir os criminosos.
Em paralelo, é importante denunciar os casos às redes sociais, que devem ser mais ágeis em derrubar as contas falsas e ter equipes especializadas, que entendam o contexto brasileiro e o português, afirma Borges. “Quantos moderadores de conteúdo do Instagram atuam no Brasil? É uma caixa preta, não conseguimos descobrir”, diz.