De volta à Bahia desde o final de fevereiro, ao menos dez dos mais de 200 homens submetidos a regime de trabalho análogo à escravidão em Bento Gonçalves (Serra Gaúcha) foram contratados nesta semana por duas empresas da cidade de Lauro de Freitas, na região metropolitana da capital Salvador. A oferta de emprego fixo e com carteira assinada partiu de um shopping center e de supermercado.
O processo de recolocação contou com a intermediação da prefeitura local. Ao saber da nova oportunidade, um dos integrantes do grupo se emocionou com o próprio relato: ele havia topado a proposta de trabalho temporária na colheita da uva no Rio Grande do Sul porque estava desempregado há quase um ano.
“Nosso sonho era esse, de trabalhar com carteira assinada e de forma digna, para ganhar nosso o sustento e o das nossas famílias”, declarou, pedindo para não ter a sua identidade mencionada. Uma situação bem diferente da que enfrentou longe de casa, com jornadas abusivas, alimentação estragada, alojamento precário e até agressões por seguranças do contratante.
O preenchimento das vagas teve como prioridade baianos nascidos na própria cidade e que foram acolhidos no Núcleo Municipal de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Contrabando de Migrantes (NETP), da Secretaria Municipal de Políticas Afirmativas, Direitos Humanos e Igualdade Racilal.
Enquanto isso, no Rio Grande do Sul, o Ministério Público Estadual – em conjunto com o da Bahia – dá continuidade ao processo sobre o regime abusivo ao qual os nordestinos eram submetidos. Promotores já conversaram com as empresas do segmento vinícola que utilizavam a mão-de-obra fornecida por empresa terceirizada apontada como responsável pelas irregularidades. Na pauta estão a assinatura de um termo de ajustamento de conduta (TAC) e o pagamento das rescisões trabalhistas.
Pedido de indenização
Outra medida pleiteada pelo MP gaúcho é o pagamento de indenização pelo vereador caxiense Sandro Fantinel, por danos morais coletivos, no valor de R$ 300 mil. Em discurso no dia 28 de fevereiro, ele ofendeu as vítimas, insinuando que não gostam de trabalhar porque são originários de um Estado onde as pessoas “só querem ficar praia e bater tambor”.
Caso ele seja obrigado a desembolsar o valor, porém, o dinheiro não será destinado aos trabalhadores, mas ao Fundo para Reconstituição dos Bens Lesados (FRBL), utilizado para ressarcir a coletividade por danos ao consumidor, economia popular, meio ambiente, patrimônio público e honra de grupos raciais e religiosos, dentre outros.
Trata-se de uma ação civil pública baseada na ideia de que Fantinel ofendeu a dignidade e o decoro dos nordestinos e incitou a população a prática discriminatória e discurso de ódio. Além disso, considera que houve “notório dano” à Serra Gaúcha: como político eleito por parte da populaçao, o vereador é uma espécie de porta-voz de sua comunidade, o que pode induzir entre os brasileiros de outros Estados a impressão injusta e equivocada de que suas palavras representam o pensamento dos gaúchos.
(Marcello Campos)