É lícito ao departamento de trânsito (Detran) local indeferir o pedido da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ao portador de permissão para dirigir que cometeu infração grave, independentemente de a mesma ser qualificada como administrativa ou na efetiva condução do veículo.
Essa é a interpretação que passou a ser adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, após definição recente sobre a constitucionalidade do artigo 148, parágrafo 3º do Código de Trânsito Brasileiro, feita pelo Supremo Tribunal Federal.
A norma diz que a pessoa que recebe a permissão para dirigir terá direito à CNH após o prazo de um ano, desde que não tenha cometido nenhuma infração de natureza grave ou gravíssima. Não há qualquer especificação sobre a necessidade de a infração ser na efetiva condução de veículo.
Apesar disso, a jurisprudência do STJ passou a atender pedidos de novos condutores para obrigar os Detrans estaduais a expedir as respectivas CNHs quando a infração grave é administrativa.
Um exemplo recorrente é do motorista que compra um carro e não transfere o documento no prazo de 30 dias. A infração, prevista no artigo 233 do CTB, era considerada de natureza grave na redação original do dispositivo — a norma foi atualizada pela Lei 14.071/2020 e agora tem natureza de infração média.
Na visão do STJ, infrações administrativas não estão relacionadas à segurança no trânsito porque não impõem qualquer risco à coletividade. Logo, não poderiam ser usadas para impedir a expedição da CNH pelos Detrans por todo o país.
Essa posição levou a Corte Especial do STJ a declarar a inconstitucionalidade parcial do artigo 148, parágrafo 3º do CTB, em 2021 (AREsp 641.185). O Detran do Rio Grande do Sul recorreu ao STF, que derrubou a orientação em acórdão da 1ª Turma, relatado pelo ministro Alexandre de Moraes (ARE 1.195.532).
Segundo o Supremo, não existe qualquer ofensa aos princípios da isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade na regra, que portanto é plenamente compatível com a Constituição.
No dia 23 de março, a 1ª Turma do STJ aplicou a nova orientação, ao dar provimento aos recursos especiais ajuizados por Detrans e autorizá-los a negar a CNH a condutores que falharam em registrar a transferência de seus veículos no prazo de 30 dias, durante o primeiro ano após a aprovação no exame da autoescola.
“Necessário reconhecer que a norma é aplicável, o que equivale dizer que é lícito ao órgão de transito indeferir o pedido da CNH ao condutor que, portador de permissão para dirigir, cometeu infração grave, independentemente dessa infração ser qualificada como administrativa ou na condução o veiculo”, afirmou o relator, ministro Benedito Gonçalves. (ConJur)