O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se mostrou incomodado com um fato que pode comprometer sua popularidade no terceiro mandato: a falta de capacidade de o Brasil crescer de forma sustentável. Essa realidade é reflexo das deficiências estruturais do País, de uma conjuntura externa pouco favorável e, em grande parte, fruto de uma série de políticas e escolhas erradas dos governos anteriores, inclusive do PT.
Analistas destacam que, entre o primeiro mandato do petista, iniciado em 2002, e o atual, o Produto Interno Bruto (PIB) potencial — capacidade de expansão da economia sem estímulos artificiais — encolheu de 3,5% para 1,5%. E, pela mediana das estimativas do mercado coletadas pelo boletim Focus, do Banco Central, o País deverá crescer menos do que o seu potencial neste ano: 0,91%. Apesar de Lula tentar jogar a culpa para o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que evita ceder às pressões políticas para reduzir a taxa básica da economia (Selic), de 13,75% ao ano, especialistas lembram que o problema é mais profundo do que o patamar dos juros.
O Brasil tem hoje o 11º maior PIB mundial, em meio ao processo de perda de capacidade de crescimento e de piora na competitividade e na produtividade. Desde 2015, deixou de ter PIB per capita de dois dígitos em dólares e, em 2022, registrou queda de 20,6% em relação ao de 2018. Pelas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), consideradas otimistas, o Brasil pode voltar a ter PIB per capita acima de US$ 10 mil em 2024. Por outro lado, as projeções da Tendências Consultoria, por exemplo, estimam que o PIB per capita só deverá voltar ao patamar de dois dígitos em 2026, ou seja, 11 anos depois de o país perder o grau de investimento.
Escolhas erradas
De acordo com a economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências, o PIB per capita do Brasil, que chegou aos dois dígitos em 2010, levará mais de 20 anos para retornar ao pico de US$ 13,2 mil, alcançado em 2011. “Estamos vendo duas décadas perdidas na economia, devido a perda de capacidade de crescimento do País, resultado de escolhas erradas dos governos anteriores e que alguns integrantes do governo Lula insistem em querer retomar, como apostar nos investimentos de estatais e nos empréstimos de bancos públicos”, lamenta Alessandra. Ela acredita que o país precisará investir mais forte em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), pois está na lanterna global nessa área fundamental.
Na avaliação do economista Otto Nogami, professor de Finanças do Insper, o país pode ficar preso na armadilha de baixo crescimento se continuar fazendo escolhas erradas. “Temos uma condição estrutural fragilizada que, nos últimos anos, piorou com a queda dos investimentos em infraestrutura, educação, saúde, segurança e mobilidade. Essas áreas foram deixadas de lado, criando um problema no sentido de que o investidor não vê uma infraestrutura adequada para as condições de produção, e assim reluta em investir ou mesmo em ampliar a produção”, avalia.
Por conta dos retrocessos, o Brasil é o país que mais perdeu capacidade de produção nas últimas décadas em relação aos demais parceiros do Brics — grupo das economias emergentes composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul —, de acordo com Nogami.
De acordo com levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), entre 2019 e 2022, o corte de gastos do governo Bolsonaro foi predominante em áreas fundamentais de programas sociais e ambientais, privilegiando o equilíbrio fiscal em detrimento da vida e do bem-estar da população.
Herança maldita
A economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), lembra que Lula enfrentará uma situação inédita: uma conjuntura macroeconômica desfavorável combinada com uma herança ruim do ponto de vista fiscal deixada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, defende que o crescimento também passa pela valorização da educação, a fim de melhorar a qualificação da mão de obra. Como professor universitário, lamenta o fato de ver estudantes brasileiros chegando à faculdade na condição de analfabetos funcionais, um resultado da precarização do ensino desde os anos 1990, quando foi instituída a progressão continuada para melhorar as notas do país nas avaliações globais. “Tudo isso é consequência de políticas erradas, que passam pela falta de um planejamento estratégico estruturado para os próximos 20 ou 30 anos”, pontua.