A investigação da Polícia Federal (PF) que apura suspeita de fraude nos cartões de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro, de familiares e de ex-assessores aponta também a existência de uma estrutura criminosa que trabalhava em favor de um golpe de Estado. A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que desencadeou a operação dessa quarta (3), cita três vezes o termo e cita a descoberta de conteúdo incriminatório que envolve o militar da reserva Ailton Gonçalves Moraes Barros, ex-candidato a deputado estadual pelo PL do Rio preso hoje.
“A investigação ainda constatou tratativas para execução de um Golpe de Estado e possível tentativa de Abolição violenta do Estado Democrático de Direito envolvendo o investigado AILTON GONÇALVES MORAES BARROS e pessoas ainda não identificadas”, diz trecho da decisão.
O ex-major do Exército teria atuado na inserção de dados falsos no sistema ConecteSUS. Ao descrever a estrutura montada para fraudar os cartões, Moraes a relacionou com a mesma associação criminosa que, no ambiente virtual, atuou para “atacar integrantes de instituições públicas, desacreditar o processo eleitoral brasileiro, reforçar o discurso de polarização, gerar animosidade dentro da própria sociedade brasileira, promovendo o descrédito dos poderes da república, estimular a animosidade entre as Forças Armadas e os Poderes da República, além de outros crimes.”
“A investigação identificou inicialmente esse modus operandi no mundo virtual, nas redes sociais, onde seus integrantes promoveram/promovem ataques para pavimentar o caminho para alcance dos objetivos traçados (ganhos ideológicos, político-partidários e financeiros). Os elementos informativos ora apresentados revelaram o processo de materialização no mundo real dos objetivos da Associação ora investigada, transbordando sua atuação para além da esfera virtual. No entanto, seja nas redes sociais, seja na realização de inserções de dados falsos de vacinação contra a covid-19, ou no planejamento de um golpe de Estado, o elemento que une seus integrantes está sempre presente, qual seja, a atuação no sentido de proteger e garantir a permanência no poder das pessoas que representam a ideologia professada.”, concluiu o ministro em sua decisão.
O esquema de falsificação, segundo o documento, foi a solução encontrada para Bolsonaro e pessoas próximas ao seu círculo manterem, perante aos seguidores do ex-presidente, a ideologia contrária à vacinação sem terem que arcar com o ônus de se imunizarem. Para isso, utilizaram do mesmo esquema que disseminou, no ambiente virtual, informações falsas sobre fraude nas eleições e estimulou uma resistência na frente de quartéis em todo o País.
“Da mesma forma, a milícia digital reverberou e amplificou por multicanais a ideia de que as eleições presidenciais foram fraudadas, estimulando aos seus seguidores ‘resistirem’ na frente de quarteis e instalações das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para uma intervenção federal comandada pelas forças militares, sob o pretexto de aturarem como um Poder Moderador, com base em uma interpretação peculiar do art. 142 da Constituição Federal. Os arquivos de áudio e capturas de tela de mensagens trocadas no aplicativo WhatsApp evidenciaram a arquitetura do plano criminoso pelo grupo investigado. Apesar de não terem obtido êxito na tentativa de golpe de Estado, sua atuação, possivelmente, foi um dos elementos que contribuíram para os atos criminosos ocorridos no dia 08 de janeiro de 2023, fato que demonstra a necessidade da pertinente autorização judicial para compartilhamento dos elementos informativos ora identificados com os autos do Inquérito 4923/DF”, pontua o documento.
De acordo com os indícios coletados pela PF, a suposta falsificação do certificado de vacinação tinha como objetivo viabilizar a entrada, nos Estados Unidos de Bolsonaro e seus familiares, além de assessores e seus parentes , driblando as exigências de imunização contra a covid. Seu ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid Barbosa, foi preso na ação deflagrada pela corporação nessa quarta.
Além de Cid, a Operação Venire prendeu mais cinco pessoas: o secretário municipal de Duque de Caxias (RJ), João Carlos de Sousa Brecha; o policial militar Max Guilherme, que atuou na segurança presidencial; o militar do Exército e também segurança pessoal de Bolsonaro Sérgio Cordeiro; o sargento do Exército Luis Marcos dos Reis; e o candidato a deputado estadual no ano passado Ailton Barros (PL).