Presidente do Superior Tribunal Militar (STM), o tenente-brigadeiro do ar Francisco Joseli Parente Camelo não usa meios-termos quando o assunto é a participação de militares da ativa na política. Ele deixou bem clara a sua posição a respeito: “Militar não é para estar em funções políticas. Os militares têm uma atividade muito específica, dentro das Forças Armadas. Compete às Forças Armadas a defesa da pátria, garantir os poderes constitucionais e, por iniciativa deste, a garantia da lei e da ordem, a paz social do país.”
Ele defende, entretanto, que os militares tenham representantes na política, mas desde que deixem as Forças Armadas. “Militares que queiram ir para a política têm que se afastar. Não é ruim que um militar vá para a política, desde que seja afastado, porque é bom que tenhamos representantes no Congresso Nacional, mas não concordo que ele permaneça [nas Forças Armadas]”, diz.
Aos 69 anos, Francisco Camelo defende que a Justiça Comum julgue os envolvidos nos atos antidemocráticos e elogia a atuação do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, a quem se referiu como corajoso.
Confira a entrevista:
1. Como é a atuação da Justiça Militar e qual a estrutura da instituição?
A Justiça Militar da União foi criada em 1808, logo que dom João chegou ao Brasil. Então, ele tomou três providências: criou a Justiça Militar, abriu os portos e nomeou seus ministros. A importância da Justiça Militar é que nós temos a responsabilidade de tutelar a disciplina e a hierarquia no seio das Forças Armadas. É esse o objetivo maior. O Poder Judiciário brasileiro é composto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e abaixo tem os tribunais superiores, são eles: o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Tribunal Superior do Trabalho (TST), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Superior Tribunal Militar (STM).
2. Militares podem ser julgados por outros órgãos? E a Justiça Militar também pode julgar civis?
Nós, da Justiça Militar, julgamos os crimes militares definidos em lei. Então, civis podem cometer crimes militares, em uma incitação em conluio com um militar, por exemplo. Assim como os militares também cometem crimes comuns, como nós vimos no dia 8 de janeiro, onde houve aquela depredação nos três Poderes da República. Aqueles locais não estavam sujeitos à administração militar, então foi um crime comum, por isso está sendo julgado pela Justiça comum.
3. É por isso que a prisão do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), foi feita pela Polícia Federal e não pelo Exército?
Foi preso pela Justiça comum porque cometeu um crime comum. Então, a prisão foi comunicada e ele foi recolhido para uma unidade militar. Ele é um militar na ativa e está sendo julgado preso nesta unidade.
4. Sobre os atos de 8 de janeiro, há algum caso na Justiça Militar?
Os dois primeiros casos, de coronéis da reserva, estão julgados na primeira instância da Justiça Militar porque foi no dia 8, mas imediatamente o Comando Militar do Planalto abriu um inquérito policial militar e esse inquérito foi conduzido pela primeira instância da Justiça Militar. São os dois processos que nós estamos julgando hoje.
5. Como o senhor avalia a atuação geral do presidente do TSE, Alexandre de Moraes?
O Alexandre de Moraes teve realmente uma responsabilidade muito grande em todo o período eleitoral. Ele é presidente do TSE, então ele tomou atitudes corajosas, mas esteve sempre dentro da lei. “Ah, o Xandão fez isso e tal”. Eu vejo que ele tem tomado atitudes corajosas em momentos difíceis que nós passamos no nosso país e eu vejo o ministro Alexandre de Moraes como realmente um grande jurista e não vejo essas incorreções que tanto falam dele. Tem sido corajoso.
6. O governo anterior teve um aumento recorde do número de militares da ativa em cargos de comissão, passando de 2.200, enquanto a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reduziu este número em quase 300. Como o senhor vê esta questão?
Os militares têm uma atividade muito específica, dentro das Forças Armadas. Compete às Forças Armadas a defesa da pátria, garantir os poderes constitucionais e, por iniciativa deste, a garantia da lei e da ordem, a paz social do país. Então, esta é a função dos militares. Militar não é para estar em funções políticas. Pode eventualmente um militar ser afastado – e é previsto até em lei que ele pode ficar até dois anos afastado –, mas não dessa forma que aconteceu, de uma maneira que em tudo que é lugar nós tínhamos militares presentes. Inclusive, eu também tenho defendido que os militares que queiram ir para a política têm que se afastar das Forças Armadas. E não é ruim que um militar vá para a política, desde que ele seja afastado, porque é bom que nós tenhamos representantes no Congresso Nacional, mas eu não concordo que ele permaneça. Por exemplo: “É candidato, perde e volta para a Força”. Não. Tomou uma decisão de um caminho político, segue esse caminho.